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A valorização dos direitos sociais exige, pelo menos, dois requisitos. Por um lado, devem ser percecionados como socialmente justos e relevantes; por outro lado, devem ser avaliáveis, quantificados, coisa que temos muitas dificuldades em fazer quando o princípio é a “gratuitidade”. As designadas creches “gratuitas” não são, na verdade, gratuitas. São pagas pelo Estado, ou seja, pelos impostos de todos, assumidas pela consideração da sua relevância para as pessoas. O mesmo ocorre com a habitação social; as rendas simbólicas decorrem da comparticipação dos impostos das pessoas que os pagam, numa lógica de solidariedade social. E também ocorre com os múltiplos apoios na educação, na saúde ou na velhice.

Na verdade, os principais inimigos das políticas sociais não são os neoliberais. Esses são apenas crentes numas extravagâncias teóricas, que já foram desmentidas pela História, mas que agora ressuscitam em nome da privatização de tudo. Os principais inimigos das políticas sociais são, isso sim, todos aqueles que se dizem convictos nos direitos sociais, deixando-os descontrolados, sem avaliação, percecionados generalizadamente como injustos e sem valor social.

Vem isto a propósito da rapariga que foi picada, há dias, em Nova Iorque, por um desses insetos que geram uma reação rápida na pele. Indo ao hospital, face aos receios das manchas e da inflamação ocorridas, teve uma breve consulta e recebeu um injetável de rápida eficácia. À saída, esperava-a a conta: 580 dólares!

Independentemente do debate sobre este modelo que trata quem pode pagar, coisa bem norte-americana e estranhamente inspiradora dos nossos entretidos neoliberais, a questão ficou clara: a consulta e a injeção têm um valor económico.

A forma de valorizarmos o modelo de apoios e direitos sociais que o país tem vindo a construir, com as dificuldades de uma democracia jovem e de recursos limitados, passa por mostrar o valor financeiro das medidas, dos apoios e dos benefícios que construímos. Importa demonstrar a conta-corrente dos benefícios sociais, assim mostrando o seu valor (diga-se, o seu custo) económico e financeiro para a sociedade.

A partir deste ano, a Câmara de Gaia passa a enviar a todas as famílias e instituições o valor das medidas sociais municipais, através da implementação da “fatura social”. Este será um instrumento de demonstração do que fazemos uns pelos outros, do valor social das instituições e do valor económico-financeiro das medidas “gratuitas” de apoio social. Parece que isso é tão relevante que deve ser feito a nível nacional, demonstrando o “custo” de cada um de nós para o sistema, ao mesmo tempo podendo comparar esse custo com a nossa participação através dos impostos. Se isto não ocorrer, corremos o risco de não valorizarmos o que temos construído e alimentarmos a “fratura social” que alguns estão interessados em provocar, colocando as classes médias contra as políticas sociais, com custos incalculáveis a prazo.

*Presidente da CM Gaia / Área Metropolitana do Porto

Eduardo Rodrigues

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