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As relações internacionais, tal como as conhecemos hoje, emergem basicamente da arquitetura geopolítica do Pós-Guerra e da Guerra Fria. De um lado, as forças ocidentais aliadas, do outro lado, os russos e os seus parceiros, com a China num papel especial.

É clara a complexidade deste processo, que não cabe aqui abordar. Mas lembremos que os então soviéticos lutaram ao lado dos ocidentais contra a Alemanha nazi. O Japão quase colapsou nesse tempo histórico, sendo atualmente um aliado do Ocidente. A instabilidade das relações com a China tem-se acentuado, culminando na revisão do Conceito Estratégico da NATO, parecendo que apenas agora as instituições ocidentais perceberam os potencialmente perigosos efeitos da Rota da Seda chinesa. Nada pior, no entanto, do que a próxima grande tensão, Taiwan.

A paz conseguida na Europa teve vários fatores, mas viveu muito dos equilíbrios instáveis da Guerra Fria, às vezes no limite do rompimento, como nos mísseis de Cuba, no Vietname ou no Afeganistão, para não tratar momentos mais recentes.

Dessa bipolarização excluíram-se alguns países ditos neutrais. A Suíça deixou isso inscrito na Constituição. Outros, como a Finlândia ou a Suécia, assumiram um amplo consenso político nacional.

No entanto, os desenvolvimentos da guerra russa contra a Ucrânia desfizeram essa neutralidade, com novas aproximações à NATO, coisa impensável tempos atrás, e outros a votarem sanções contra a Rússia, levantando intensos debates jurídicos, como na Suíça, onde alguns consideram que os limites da neutralidade vão ao ponto de não viabilizar quaisquer sanções, afinal, uma forma de participação na guerra.

A confusão gera-se na interpretação dos conceitos. Um país neutral não é um país sem valores, indiferente aos crimes, alheado do Mundo. Um país neutral assumia uma posição distante (não equidistante) dos jogos políticos e militares internacionais. Mas a invasão da Rússia mostrou que neutralidade não é indiferença e que se reforçaram os laços dos países da Aliança Atlântica e dos países da União Europeia.

Tudo isto tem um preço para a economia ocidental. Face a estes contextos, a UE tem o duplo papel de construir políticas de resposta às dependências internacionais, outrora dissimuladas pela dita globalização e expondo hoje fragilidades sérias em setores estratégicos (energia, indústria, tecnologia, etc.) e, por outro lado, responder às brutais consequências económicas e financeiras para os europeus, evitando o cansaço com os efeitos dos embargos e das sanções europeias. A União Europeia faz bem em manter as sanções à Rússia, mostrando a sua censura à guerra e defendendo valores inalienáveis. Mas tem que reforçar as políticas económicas, financeiras e sociais, para compensar os embates desta guerra (inflação, perda de poder de compra, aumentos de preços, etc.). A Rússia nunca ganhará a guerra que começou. Mas pode infligir danos sérios na política europeia, se esta não conseguir dar respostas eficazes aos seus efeitos penosos na vida dos povos europeus.

*Presidente da CM Gaia/Área Metropolitana do Porto

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Eduardo Rodrigues

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