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A abordagem ao reequilíbrio financeiro dos contratos públicos e à própria lógica da revisão de preços ganhou novo fôlego na atualidade.

A elevada carga burocrática e processual da contratação pública pereniza os procedimentos administrativos muito para além do razoável. São etapas excessivas, permeabilidade a impugnações maioritariamente artificiais, quase sempre com efeito suspensivo, tornando o processo num longo e penoso calvário. Isto é feito em nome dos argumentos da transparência e do rigor. Mas é possível ter transparência e rigor, ao mesmo tempo que se arbitram regras claras, ágeis e escrutináveis. Mais exigência ética e mais fiscalização (fazendo, por exemplo, retornar a IGAL), menos carga burocrática e menos prazos longos, eis o equilíbrio virtuoso.

A carga burocrática e a duração dos procedimentos de contratação pública não são compatíveis com a evolução do mercado. Um procedimento que tramite dois anos corre o risco de não ser interessante para quem pensa concorrer, ou de não ser bom para quem recebe a adjudicação ao fim de um tempo suficientemente longo que viu alterados estruturalmente os preços com que se apresentou a concurso. Se, no primeiro caso, alimentamos concursos desertos, no segundo, alimentamos abandonos de adjudicações ou, mais tarde, abandonos a meio das obras e/ou dos fornecimentos (isto coloca-se também nos fornecimentos de bens).

A pandemia reforçou estas tendências. Numa primeira fase, foi o impacto da retração das compras e dos procedimentos, normal em tempos de confinamento geral. Numa segunda fase, foi o aumento dos custos da mão de obra e das matérias-primas ou das commodities. Os efeitos sentiram-se nas prorrogações de prazo das obras e o algoritmo da revisão de preços pouco ou nada respondeu a estas novas questões.

A guerra extremou tudo isto. Os preços explodiram, as bases de qualquer proposta estão postas em causa pela alteração estrutural dos custos das matérias-primas, dos transportes, da energia, etc.

É fundamental uma alteração legislativa que viabilize outras fórmulas de revisão de preços nos contratos e autorizações devidamente fundamentadas de reequilíbrios financeiros dos mesmos, evitando concursos desertos e/ou abandono de obras, com consequências perversas a todos os níveis, nomeadamente na não execução dos fundos europeus.

Os reequilíbrios financeiros não contentam os municípios. Mas interessam aos municípios e ao país para garantir o normal funcionamento das empreitadas e dos fornecimentos, evitar o incumprimento dos fundos europeus e a correspondente devolução de dinheiro. Interessam para preservar a atividade económica em setores imprescindíveis, como as refeições escolares, os transportes, as obras imperiosas ao abrigo de financiamentos europeus. Evitar esta abordagem por receios de debates populistas é ceder ao que se receia.

Presidente da Câmara Municipal de Gaia e da Área Metropolitana do Porto

Eduardo Rodrigues

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